Entertenimento e Insatisfação

A constante necessidade de estar ocupado como fonte de insatisfação

Quando não estamos a dormir, normalmente a nossa forma de operar nesta vida resume-se a estar ocupado: estamos sempre a fazer alguma coisa, imersos em actividades, temos sempre alguma tarefa para desempenhar, um objectivo para alcançar. Afinal, como diz o ditado, “parar é morrer”. Mas será isto fonte de satisfação ou, na verdade, fonte de insatisfação?

A nossa existência não fica completa se de repente pararmos, se não produzirmos, se não nos distrairmos (temos, até, medo, se isso acontecer). Gastamos o nosso tempo em inúmeras tarefas: trabalho, carreira, cuidar da casa, tarefas relacionadas com os filhos e família, lazer, convívio, entretenimento dos mais variados tipos, estatuto e prestigio, cuidados com a nossa aparência, etc.

Estamos numa Era em que são tantas as possibilidades de entretenimento: desde Netflix, aos jogos de futebol, vídeo jogos, saídas com amigos, viajar, decoração, cozinhar, desporto, redes sociais,… e por aí fora. Difícil é não ter nada para fazer. Quando estamos exaustos, mergulhamos no entretenimento.

O nosso funcionamento de base é de alguém que tem a necessidade de estar ocupado, alguém que está em constante movimento, mas também em constante insatisfação.

O verdadeiro problema: os movimentos descontrolados da nossa mente

O movimento físico está naturalmente ancorado no movimento mental. A nossa mente está habitualmente perdida num sem número de inquietações, receios, expectativas, nalguma ideia interessante do que fazer a seguir.

Habituámo-nos a ter o nosso intelecto, tal como um motor que nunca pára, em constante actividade, incessantemente, até que a morte chegue.

Pelo facto de estarmos constantemente perdidos nos afazeres desta vida, nesta obsessão pelo movimento mental e físico – diria mesmo vício – , a paragem que vivemos hoje, devido à pandemia, traz-nos grande inquietação, depressão, uma série de estados mentais negativos, uma ainda maior insatisfação.

E com o que é que normalmente colmatamos a falta de estímulos, a insatisfação? Habitualmente com substitutos (mais Netflix).

Não estamos aptos a pura e simplesmente existir sem desempenhar uma acção, seja ela mental ou física. Sem estímulos, há algo que desperta dentro de nós, que nos corrói e nos causa inquietação e insatisfação e, em alguns casos, provoca um enorme sofrimento.

Qual será a verdadeira causa dessa insatisfação?

Então a pergunta que se coloca aqui é “Porquê?”, porque é que isto acontece? Será que está no nosso ADN este modo de operar? Será que estamos biologicamente bloqueados, que é apenas assim que as coisas são?

Numa análise dos exemplos que temos à nossa volta – porque aparentemente todos somos assim -, a tentação será responder “sim, parece que estamos condenados à insatisfação constante”.

Bom, é minha convicção – pelo que tenho investigado – que isto não tem de ser assim. Creio que podemos colocar uma hipótese diferente para a causa. Podemos olhar para esta constante necessidade de movimento mental e físico meramente como um “vício”.

A nossa reacção à ausência de estímulos é muito semelhante à reacção de alguém com uma adição. Por exemplo, alguém com uma adição grande em nicotina, se for impedido de tocar em cigarros passado algum tempo sente desespero. Da mesma forma, se estivermos o tempo suficiente sem estímulos ficamos desesperados. Então, uma hipótese, será tratar isto como se trata um vício. Pode valer a pena testar.

De seguida a pergunta lógica será, “mas então faço o quê? Se aquilo que mais me preenche é trabalhar e agora não posso?”. A proposta que se coloca em cima da mesa é a de explorarmos recursos interiores, recursos subjectivos (subjectivos no sentido de serem relativos ao sujeito e não no sentido de serem abstractos), por oposição a recursos focados no objecto exterior.

Uma revolução do paradigma atual

Seremos nós capazes de cultivar estados interiores que nos tragam realização e a satisfação que tanto projectamos nos objectos exteriores?  E, se sim, que repercussões poderia isso ter na nossa vida e na vida que dos que nos rodeiam?

O facto de termos uma abordagem focada no objecto, levar-nos-á inevitavelmente ao consumo. Temos que adquirir algo que nos preencha. É a abordagem do caçador/buscador.

O impulso de consumir existe e parece que temos necessidade de obter algo do mundo exterior que nos preencha interiormente, que nos liberte da sensação de insatisfação. Pode ser um objecto específico como um carro, um computador, um novo vestido, ou podem ser também pessoas, cargos ou até ideais. Precisamos de tudo isso para nos sentirmos bem, até da afectividade de alguém. Na verdade, somos completamente dependentes, não somos verdadeiramente independentes, nem livres.

Por oposição: alguém que cultiva dentro de si qualidades que lhe tragam paz de espírito e realização, não depende de outros. É a abordagem do cultivador. É uma abordagem sustentável que conduz à satisfação, à independência e à liberdade.

Cessação da fixação com o exterior para uma maior harmonia global

Podemos fazer um exercício de imaginação: imaginemos que todos os Seres Humanos tinham dentro deles tudo aquilo que procuravam para se realizar; que subitamente tudo aquilo que esperavam dos objectos exteriores, toda a satisfação que precisavam, estava dentro e não fora.

Naturalmente que o consumo de recursos deixaria de fazer sentido uma vez que não precisavam mais do que o estritamente necessário.

Não haveria sentido em causar sofrimento e matar outros animais para satisfação de um mero prazer sensorial. Não faria sentido acumular fortuna, nem acumular prestígio, nem criar divisões, provocar guerras, desbravar os recursos naturais do planeta.

Talvez aí, sim, as verdadeiras causas da sustentabilidade do planeta fossem atingidas.

Porque enquanto acharmos que a fonte da nossa felicidade está no mundo lá fora, haverá sempre a necessidade de ir em busca de. Continuaremos a destruir florestas, a dizimar espécies, a explorar,… porque é necessário produzir para satisfazer as nossas “necessidades”.

Se conseguirmos encontrar esses recursos interiores, ao invés de tentarmos obter a felicidade do mundo, seremos aqueles que trazem a sua própria felicidade para o mundo. Não tentaremos retirar do mundo a nossa felicidade, ofereceremos ao mundo a nossa felicidade.

Todos os problemas da humanidade advêm da incapacidade do ser humano se conseguir sentar sozinho e silenciosamente, entregue a si próprio num quarto.” ~ Blaise Pascal

Blaise Pascal foi um matemático, escritor, físico, inventor, filósofo, teólogo católico francês do se. XVII

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